No
fim de semana passado estive em Aracaju a trabalho. Na verdade não sei dizer
muito bem se o que eu faço é trabalho, já que falei de literatura num dia e
psicanálise no outro. Mas a isso chamamos de trabalho de transmissão. Aproveitando
a viagem, fomos todos: filho, marido, papagaio, periquito, etc. Ficamos
empolgados porque Adriano, que ainda não tem dois anos completos, teria a
oportunidade de conhecer o mar. Eu só o conheci aos 14 anos. Foi lindo, mas não
teve uma vez que eu fosse e não tivesse alergia a não sei quê. Trabalho
finalizado, nossa amiga Alba resolveu nos levar à praia. Ficou encantada quando
soube que seria a primeira vez do Adriano.
Pra começar, quando chegamos, ele já
se encantou com a areia. Ele ama areia, tanto que nos parquinhos das praças
daqui de Campo Grande só falta rolar. Deu o que fazer para trocar sua roupa e
passar o protetor solar, já que ele estava empanado em cinco minutos. Jogava areia
na cabeça, esfregava nas bochechas, na boca e muitos outros lugares. Detalhe:
enquanto estávamos nos preparando para entrar na água, buscávamos nossa própria
sombra, mas Adriano queria o sombreiro alheio, enfiava-se debaixo da mesa dos
outros e era um Deus nos acuda pra tirar. Guri ensopado de protetor solar,
fomos para a água.
Ele ficou atento à areia molhada,
observando os pés a afundarem. Veio a primeira onda, ele achou engraçado. A segunda
veio mais forte, ele achou mais engraçado ainda. Eu e o pai, segurando pelas
mãos, fazendo com que pulasse as pequenas ondas. Ele queria ir mais adiante mar
adentro. Tomou o primeiro caldo. Não chorou. Sentei na areia com ele e ficamos
ao sabor do ir e vir das ondas. O pai correu pra sombra e ficou nos filmando de
longe.
Quando eu quis sair da água, já
cansada, com areia até no intestino delgado, chamei Adriano pra sair. Peguei-o
no colo e fui caminhando em direção à nossa sombra. Lá estavam meu marido e
Alba. Mas Adriano não queria sair da água. Chorando, berrando e esperneando,
chegou à areia seca. Mas assim que o soltei, saiu correndo em direção ao mar. Corri
atrás. Ele não tinha medo de nada. Mais ondas, mais risos, mais pulinhos e
sapatear na água. Minha coluna já começando a dar sinais de querer esticar-se. Vamos
sair? Colo. Esperneio. Choro. Berro. Areia seca. Alba (gargalhando). Pai
(filmando). Solto na areia e ele corre em direção ao mar. Corro atrás. Ele
realmente não tem medo de nada. Ondas. Gargalhadas. Pulos. Sapateado aquático. O
guri ficando com a pele queimada e uma novidade: a onda vinha e ele queria se
jogar nela. Tomou alguns caldos, mas não se inibia. Vamos sair? E a série
seguiu ainda umas cinco ou seis vezes.
Com a coluna querendo esticar-se, a
areia chegando ao duodeno, contra os protestos do Adriano, fomos nos esconder
do mar e comer alguma coisa. Alba estava impressionada, pois, mesmo sendo do
nordeste, mesmo já tendo convivido com muitas crianças entre filho e sobrinhos,
nunca havia visto uma criança que logo de primeira já tivesse tanta intimidade
com o mar. Ela ria tanto durante nossas idas e vindas porque o menino parecia
um crocodilinho ou uma tartaruguinha marinha. O mar é a representação do
infinito, e deparar-se com isso pode desencadear um sentimento de angústia e
desamparo. É preciso um jeito especial para apresentar o mar às crianças pela
primeira vez, colocar de costas, explicar que é a representação do infinito. Colocar
primeiro numa bacia d’água para que a criança se sinta contida (aquele lance do
continente e conteúdo). Adriano rasgou o infinito e tombou os melindres do mar.
Era disso que ríamos. Como se os dois já fossem velhos conhecidos. Como se ali
estivesse acontecendo apenas um reencontro.
Me lembrei que o nome Adriano
significa “natural da Ádria”, “natural da água” ou "aquele que é
escuro". O nome Adriano tem origem no latim Adrianus, derivado de adrianu,
que significa “natural da Ádria”. Em etrusco adria quer dizer “água”. Ádria é
uma cidade situada no norte da Itália, banhada pelo Mar Adriático. Sabe-se lá
os mistérios da vida. Enquanto comíamos num restaurante à beira-mar, procuramos
uma mesa que não ficasse tão de frente para a água, mas Adriano corria de um
lado a outro, em busca do mar. Alba se propôs a andar um pouco com ele enquanto
comíamos, voltou em dez minutos com meio metro de língua pra fora porque o
menino havia avistado a água e saído desembestado. Ela atrás gritando: “Menino!
Volte! E seu pai? E sua mãe?”. Enquanto isso, ele corria de braços abertos mar
adentro.
Foi lindo, emocionante. Achamos que
ele ia dormir no caminho de volta pro hotel, mas ele foi cantando, feliz da
vida por conhecer o infinito. Quanto a mim, tive que tomar um dorflex e deu um
trabalho danado me livrar da areia a tamponar o real dos meus furos.
Isloany
Machado, 08/08/2017.
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