Na
última vez em que tentei escrever sobre como foi receber a notícia de que serei
mãe de menino, percebi que a perplexidade maior foi quando soube que seria mãe,
apesar de não ter sido surpresa. Então, passei o texto todo falando sobre isso,
de modo que ele ficou enorme e não consegui (?) atingir meu objetivo. O fato é
que a preparação para este novo papel tem sido branqueadora de cabelos. Ainda assim
se consegue extrair prazer nisso tudo.
Quando
comecei a pensar em ser mãe, nasceram os primeiros cabelos brancos. Agora que
já carrego meu filho na barriga, depois de alguns anos, noto que já não “sou
uma garotinha, esperando o ônibus da escola, sozinha!”. Quando eu era garota,
podia arrumar meu cabelo como quisesse, jogar pra um lado e pra outro, que
estava tudo certo. Agora, antes de sair de casa, tenho que olhar no espelho e
escolher arrumar de modo que os brancos apareçam menos.
Serão
as preocupações com o filho a caminho ou a idade avançando? Bem, de qualquer
modo, toda a ansiedade desaparece quando sinto seus chutinhos. E coloco assim
no diminutivo porque comecei a sentir com dezoito semanas, ou seja, há duas. Ele
está pequeno e os chutes causam uma agradável sensação de vida em explosão. Sei
que daqui a pouco os chutes serão tão fortes que darão a sensação de vida
querendo sair da casca a todo custo!
Eu,
que gosto tanto de palavras, a ponto de quase esquecer que tenho um corpo, vivo
uma sensação inédita. Trata-se de uma experiência corporal, pois não nutro meu
filho com palavras, mas sim com tudo o que como e com o que já tenho no corpo. Desde
já é uma doação. Agora entendo melhor ainda o que a Psicanálise quer dizer
quando coloca o bebê como falo da mãe. Há sim uma ideia de que sou bem
importante, tanto que quase esqueço a falta. Escrever inclusive, que é algo que
faço com minha falta, tem sido mais raro.
Geralmente,
escritores são sonhadores, devaneadores, com muita dificuldade nas coisas
práticas da vida. Achei que isso fosse incurável, mas este bebê que carrego me
conectou com meu corpo, com a comida, com as finanças, etc. Talvez essa cura
seja temporária, não sei, mas terei que cavar agora novas faltas e novos
desejos para continuar escrevendo. Ou quem sabe eu e ele escreveremos uma nova
história, cujos rumos dependerão muito pouco do meu desejo. Poderei quem sabe
escrever sobre as histórias engraçadas que grávidas passam. Mas espere, isso eu
já posso fazer agora! Então vejamos:
Todos
– homens e mulheres – passam a mão em nossas barrigas, que se tornou coisa
pública. A forma de cumprimentar agora dispensa beijo no rosto, aperto de mão,
tapinha nas costas, e se a grávida tenta qualquer dessas coisas, fica no vácuo
e, quando menos espera, uma mão se gruda à sua barriga.
De
repente, o mundo fica cheio de mulheres grávidas pra todo lado. Talvez isso
seja armação do inimigo, mas confesso que vejo grávidas em todos os lugares,
nas praças de alimentação dos shoppings, nos supermercados, saindo dos bueiros,
caindo do céu, brotando das latas de sardinha e atum, etc.
Você
vê nas redes sociais mulheres magras que foram mães de gêmeos há poucos meses
postando fotos com as barrigas secas e dizendo: “Você pode voltar a ter sua
barriga de antes, desde que tenha uma alimentação saudável e pratique
exercícios”. Então você se encanta com a ideia de voltar a ter uma barriga
seca, até o minuto exato em que se lembra que nunca voltará a ter uma barriga
seca, pelo simples fato de que nunca teve tal barriga, desde quando você
nasceu.
Todos
têm uma história trágica pra contar de alguma mulher que conhecem e cuja
barriga virou uma renda de tanta estria, ou então de uma aqui ou ali que se rasgou
toda parindo um bebê enorme. Quando o apelo não é maior e nos contam histórias
de bebês que morrem.
Mas
não dá pra negar que há também histórias lindas, e é isso que me acalma
enquanto sinto meu bebê se espreguiçando todo dentro do útero. Órgão que até
então não fazia a menor diferença na minha vida. E é incrível saber que uma
bolinha de nada de repente tem a forma humana e vai crescendo dentro de você. Acontece
aos milhares todos os dias mundo afora, eu sei, mas ainda me parece que cada um
é um pequeno milagre. E olha que eu não acredito em milagres, pois sei
exatamente do que é preciso para fazer um bebê, mas desejar viver e permanecer vivo
nesse mundo é sim um milagre. Então defino milagre segundo o meu dicionário
pessoal: Milagre. Substantivo masculino. Ato de acreditar mais na vida que na destruição.
Apostar no humano, mesmo com todas as evidências levando ao contrário. Querer viver.
Querer ver a vida em sua sequência, mesmo que isso seja bem narcisista. Que se
dane.
Quando
comecei a senti-lo mexer, não tinha certeza se era isso mesmo, então esperei
uns dias pra contar pro pai, na expectativa de compartilhar com ele, pelo menos
um pouco, da sensação. Quando tive certeza, disse a ele: “O bebê está se mexendo,
quer sentir?”. “Sim”, respondeu prontamente. Com a mão sobre minha barriga –
coisa pública – o bebê chuta. O pai, ansioso e incrédulo, pergunta: “Será que
não são gases?!”. Ora, e gases por acaso chutam??? Era ele mesmo, com suas
pequenas pernas, se preparando para ganhar o mundo, ainda que a princípio,
ganhar o mundo signifique sair do útero.
Na
verdade, há muitas histórias engraçadas, inclusive uma delas é a da descoberta
de que era menino e a reação das pessoas quando contamos. Mas Ih! Vejo que o
texto ficou enorme de novo e terei que contar no próximo, prometo!
Esta barriga não é a minha, mas como barrigas de grávidas são coisas públicas, peguei uma barriga qualquer.
Isloany Machado, 22/05/2015
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