Meu querido, que saudade!
Já faz um tempão que não te escrevo, mas penso
em você todos os dias. Andei um pouco ocupada com algumas coisas e ando
demorando mais pra escrever mesmo, não só as cartas pra você, mas todas as
outras coisas. Às vezes penso que gastei toda a minha inspiração, mas depois
vejo que ela volta. Sabe que quanto mais tempo à toa eu tenho, mais penso
coisas e mais consigo escrever? Pois é, o tempo é uma coisa magnífica, na minha
opinião.
Nesse tempo que não nos falamos, sua mãe foi
muito eficaz em me dar notícias suas. Soube que no início do ano você andou
meio chateado porque mudou de turma na escolinha e teve que se separar da
professora que tanto gostava. Soube que fez protestos com as professoras novas,
não queria deixá-las tirarem suas sandálias e roupas pra tomar banho! Não queria
nem mesmo ir pra escola. Tudo isso pra ficar perto de quem você gosta! Achei
muito nobre da sua parte, apesar de que sua mãe já estava se descabelando sem
saber o que fazer com suas recusas.
Todos tentavam acalmá-la dizendo que em breve
você se acostumaria e tudo ficaria bem, mas eu acho que nenhuma mãe gosta de
ver o filho sofrendo. E você estava sofrendo, ora bolas. Talvez essa professora
tenha sido seu primeiro amor depois de sua mãe. E abrir mão de um amor é
difícil mesmo, como dói. Você a via, todos os dias, cuidando de outras
crianças que não eram você, deve ter ficado enciumado, eu te entendo. Vou te
dizer uma coisa que eu sei que não consola, mas direi mesmo assim: com o tempo,
outros amores virão. Além do mais, por mais que a professora goste de você, o
amor que ela sente é de mãe também, é de cuidado, etc. Você não ia querer isso
né? Já soube que está mais conformado com a separação, até já faz as coisas na
escolinha sem chorar. Outro dia sua mãe me contou que entrou e nem deu tchau
pra ela.
É incrível perceber o quanto você está
crescido, como o tempo passa rápido. Agora você não tem mais cara de bebê e já
não está mais agindo como um! Você já está falando Henrique, já está mais fácil
sobreviver, não é? Com a linguagem, tudo fica mais fácil, e ao mesmo tempo – em
breve você perceberá – tudo fica mais difícil também, mas ela te ajuda a fazer
coisas legais como abandonar as fraldas! E não foi exatamente isso o que
aconteceu semana passada? Fiquei emocionada ao saber, por vários motivos:
1.
A fralda
devia esquentar sua bunda à beça e deve ser um alívio não ter mais que usar;
2.
As
meninas e também seus colegas vão te olhar com outros olhos agora, pois você
deu um passo a mais;
3.
Sua mãe
está feliz por sua conquista;
4.
Seu pai,
radiante porque economizará não tendo que comprá-las mais;
5.
Sua avó
poderá contar para todas as comadres dela que o netinho não usa mais fraldas;
6.
Nem tão
cedo você precisará andar com um cocô pendurado na bunda e nem precisará ficar
melecado de pomadas contra assaduras. Pode ser que quando estiver bem velhinho
precise de novo, mas até lá há tanto a fazer sem elas que você nem se lembrará
mais como é.
Largar as fraldas é dar um grande passo rumo à
independência, é poder ter mais controle do seu corpo. E tudo isso graças, mais
uma vez, às palavras que te permitem gritar “Mãe! Cocô!” e correr pro seu
vasinho sanitário. Depois virão ainda muitas coisas, mas existem alguns
marcos na vida. A primeira palavra, por exemplo, inaugura sua entrada num
universo que permitirá que você seja compreendido sobre o que deseja; o
primeiro passo permite que você não dependa dos outros para levá-lo até seus
objetivos, que por ora são mexer nas coisas de casa, mas futuramente te
permitirão andar livremente pelas ruas, contemplando o que quiser; sobre as
fraldas já falamos; aprender a ler e escrever também são dois grandes passos
que geralmente vêm juntos.
Depois tem a troca dos dentes, na qual você
abandona os dentinhos que carregava desde quando era bebê e ganha uns dentões
que carregará pelo resto da vida, não os deixe estragarem! Mais ou menos aos
doze você entrará numa fase chata da vida chamada adolescência, em que você
fica chato, tudo ao seu redor fica chato, e não consegue definir se ainda é
criança ou não. Depois vem a fase dos namoros da escola, prepare-se para sentir
dores no coração, caso você seja parecido comigo, é claro. Depois, tudo passa
muito rápido e você estará na faculdade, se esse for o seu desejo, e poderá
morar sozinho, longe de seus pais. No começo será difícil, tanto pra você como
para eles, mas depois fica bom, é como tirar as fraldas. Mas já estamos indo
muito longe. Por enquanto concentre-se aí no cocô e no xixi, depois vamos
conversando.
Isloany Machado, 09
de março de 2015.
P.S.: Te amo muito. Parabéns pela conquista!
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