Para minha mãe.
Um
amor de mãe nasce com a pessoa? O amor de filho é menor que o de mãe? O amor
fica e o ódio, bem, o ódio jogamos debaixo do tapete. Ele nos marca de outras
formas, faz o peito ficar esmagado, traz culpa. Amor de mãe precisa ser, mas
não nasce incondicional. Às vezes me pergunto se amor de filha também precisa
ser assim, incondicional. Olho as outras pessoas. Pensando em tudo isso entendi
que sinto amódio, mas por que é tão difícil te dizer?
Eu
odeio quando você come doce e eu preciso dizer que pare de comer, pois é
diabética.
Mas
eu amo quando você come doce porque fico sabendo que você ainda é criança.
Eu
odeio suas certezas, porque se coloca num lugar de quem tudo sabe.
Mas
eu amo suas certezas, porque me dão a segurança para perguntar qual o tempo de
cozimento do feijão.
Eu
odeio quando, mesmo depois de todo esse tempo, você me obriga a arrumar meu
guarda-roupa, porque me sinto incapaz de cuidar da minha casa.
Mas
eu amo quando, mesmo depois de todo esse tempo, você me obriga a arrumar meu
guarda-roupa, porque eu não gosto de fazer isso sozinha.
Eu
odeio quando vejo a pressa com que você come, odeio a sua pressa de viver,
porque me parece que quem tem pressa de viver tem pressa de morrer.
Mas
eu amo a sua pressa, porque perder tempo é ruim.
Eu
amo estar longe de você porque assim posso ser eu mesma sem ter que responder a
suas expectativas.
Mas
eu odeio estar longe de você, porque longe assim não sei bem quem sou.
Eu
odeio as rugas do seu rosto, porque tenho medo de te perder.
Mas
eu amo as rugas do seu rosto porque sei que você está viva.
Eu
odeio quando te vejo com medo.
Mas
eu amo quando te vejo com medo, porque te sei humana.
Eu
odeio me parecer com você, para além do físico.
Mas
eu amo me parecer com você, porque sempre te achei linda.
Eu
odeio te ver chorando, porque me sinto absolutamente impotente diante de seu
sofrimento.
Eu
não amo te ver chorando, mas prefiro te ver chorando do que medicada e deitada
na cama, aMORTEcida.
Eu
odeio quando você faz o relatório diário de tragédias da cidade, mas sei que é
seu jeito de dizer que tem medo da morte.
Queria
que o gênero de sua vida mudasse, que a tragédia virasse comédia. Ou ao menos
que sua forma de expressar suas dores fosse tragi-cômica, já que não se muda da
água pro vinho. Eu deveria acreditar em milagres?
Pois,
não acredito. Não acredito em milagres porque milagres são mudanças de fora pra
dentro e eu só acredito em mudança de dentro pra fora. Só acredito em mudança
construída, conquistada. Milagres fazem as pessoas dizerem “eu sinto amor
incondicionalmente”, mas o incondicional mente. É porque não acredito em
milagres que posso dizer, sem medo, mas ainda não sem culpa, que eu sinto
amódio. Assim dou alívio ao peito esmagado. Assim desfaço o nó que tenta
apertar a garganta, metaforicamente. Ainda bem que aprendi a usar metáforas. Há
outros dentre nós que não souberam o que fazer para desatar os nós da garganta.
Perto
de você, eu sou. Perto de você eu tinha que ser.
Longe
de você, eu não sou. Longe de você eu posso não ser, pois longe de você eu não
preciso ser. Não ser me desobriga. Não ser me fez escrever.
Isloany Machado, 03 de abril de 2013.
P.S.: Te amo, mas o
incondicional mente.
Maravilhoso !!!
ResponderExcluir;)
ExcluirObrigada, Isloany!
ResponderExcluirQuanta sensibilidade!
ResponderExcluirAngela e Camila, obrigada pelos comentários!
ResponderExcluirAbraços
Fantástico ! adorei como vc resumiu "meu" amódio" obrigada pela sua sensibilidade!
ResponderExcluirObrigada Monica!!
ExcluirBeijo
Para minha mãe tbm ;)
ResponderExcluirMilagres fazem as pessoas dizerem “eu sinto amor incondicionalmente”, mas o incondicional mente
É sobre isso que estava falando mesmo!
ResponderExcluirTexto maravilhoso!
Obrigada pela dica, obrigada por compartilhar tudo isso!
Bjs