Mas eu nunca havia me dado conta
do caso até o fatídico dia. Cursava ensino médio e o professor de física
dividiu a turma em grupos “homogêneos”. Ele acreditava que nós adolescentes
éramos todos iguais. A divisão foi motivada por um seminário que ele estava
propondo que fizéssemos. A proposta era assim: “Vocês querem fazer um
seminário?”. Bem, na verdade a proposta era assim: “Vocês vão fazer um
seminário!”.
Os grupos foram divididos. Nem de
longe consigo me lembrar a matéria de que se tratava. Na verdade eu era péssima
também em física. Das exatas, o que salvava era a matemática, pois a memória
era boa para fórmulas. “Minha terra tem palmeiras onde canta o sabiá, seno a
cosseno b, seno b, cosseno a.” Mas eis que na física, nunca consegui
entender/calcular onde cairia a bolinha que o aviãozinho havia soltado a não
sei quantos metros de altura e não sei em que velocidade.
Chegado o dia do seminário de
física, fiquei responsável pela resolução demonstrativa de um exercício na
lousa. Estava tremelicando de medo do professor. Fiz o exercício e fiquei até
bem satisfeita com a calma que demonstrei, cheguei a pensar que pudesse estar
começando a entender alguma coisa. Os olhos do professor eram implacáveis e
hoje, impagáveis. Nosso grupo apresentou, depois outros. Ao final veio a
avaliação oral do professor. Foi quando fiz a grande e, quiçá, a mais
importante autodescoberta.
Ele começou a esbravejar, segundo minhas
lembranças, como louco. Gritava e dizia que tudo estivera uma grande
m...meleca. Apenas um único grupo se salvou das ácidas críticas do professor.
Nem me lembro o que este grupo específico fez que mereceu tantos elogios. O
fato é que na hora da avaliação do meu grupo, depois de esculhambar cada um de
meu colegas, ele fez com que todos olhassem para o exercício resolvido no
quadro. Estava correto. Mas o número cinco...
“Minha filha, onde foi que você
aprendeu que ISSO é um número cinco? ISSO, pra mim é um S e, se você escrever
esse S na MINHA prova, EU TE DOU ZERO!!!”. Berrou o professor. Tremi da cabeça
aos pés, um nó formou-se em minha garganta, mas não chorei. Foi assim que
descobri que não sabia fazer o número cinco. Entrei em crise de existência,
pois tudo o que calculara até ali não fizera sentido nenhum. Fora uma farsa!
Uma tremenda farsa! Não se pode somar o dois com o S. Descobri que escrevera
nas minhas continhas copiadas da lousa desde a primeira série: “Calcule quanto
é 2+S”. Eu respondia alegremente “2+S= 7”. ESTAVA ERRADO! Porque não se pode
somar maçãs com cadeiras, não se pode somar números e letras. Desaprendi tudo.
Eu sempre somei a letra S com
todos os outros números. Me senti fracassada. Todo o meu edifício matemático
ruiu, pois havia um problema estrutural: se 5 não é = a S, logo 5 ≠ S. Teria
que estudar tudo de novo. Mas era muito tempo perdido já, então, a partir
daquele dia, tentava escrever corretamente o número cinco, mas era tarde
demais. Abandonei as exatas e optei pelas humanas. Anos e anos longe dos
números, eis que um belo dia fui estudar Lacan e me deparei com fórmulas de
letras e números...só então pude rir da parvoíce do professor de física, pois é perfeitamente possível misturá-los. Lá estava o S
para todo lado, ou seria o cinco?
Isloany Machado, 03 de agosto de
2012.
Adorei!!!
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